Publicada em 04/11/2024 às 15h28
Integrantes do Palácio do Planalto e do Ministério das Relações Exteriores disseram à GloboNews nesta segunda-feira (4), de forma reservada, que o governo brasileiro, por ora, não tem intenção de chamar de volta a embaixadora em Caracas, Gilvânia Maria de Oliveira.
Na linguagem diplomática, quando um país chama o embaixador de volta, seja em definitivo ou para consultas por determinado período, esse ato representa que um governo quer demonstrar ao outro sinais de incômodo e até reprimenda.
Geralmente, quando isso acontece sem que haja uma ruptura formal das relações diplomáticas dos países, algum funcionário com status inferior ao de embaixador, como o encarregado de negócios, assume o comando da representação diplomática.
Na semana passada, diante do acirramento nas relações diplomáticas entre os dois países, o regime de Nicolás Maduro chamou de volta a Caracas o embaixador em Brasília, Manuel Vadell.
Na ocasião, o país vizinho argumentou que ter tomado a medida em razão de "declarações intervencionistas e grosseiras" do governo brasileiro.
Em julho, após a votação no país, o Conselho Nacional Eleitoral venezuelano reconheceu a vitória de Maduro, mas não divulgou as chamadas atas eleitorais.
Além disso, a Suprema Corte do país, alinhada a Maduro, também reconheceu sua vitória e proibiu a divulgação das atas, que, segundo a oposição, demonstrariam a vitória de Edmundo González.
Diante disso, o presidente Lula passou a cobrar publicamente a divulgação das chamadas atas eleitorais. Além disso, o Brasil articulou nos bastidores para que a Venezuela não entrasse no Brics, e o assessor especial de Lula para assuntos internacionais, Celso Amorim, disse que houve "quebra de confiança" nas relações entre os dois países.
Nesse contexto, na semana passada, em um ato de um órgão de governo e não da diplomacia, a Polícia Bolivariana da Venezuela publicou uma imagem com a bandeira do Brasil e a silhueta de um homem que aparenta ser o presidente Lula com a seguinte mensagem: "Quem se mete com a Venezuela se dá mal."
Em resposta, o Itamaraty divulgou nota em que diz ver com "surpresa" o tom ofensivo adotado pela Venezuela contra o Brasil.
Diplomatas, analistas e professores ouvidos pela GloboNews avaliam que o momento na relação com a Venezuela é o mais "tenso" desde o começo do terceiro mandato do presidente Lula, em 2023. Eles divergem, contudo, sobre a possibilidade de uma ruptura diplomática.
Segundo um diplomata, não há "chance alguma" de o Brasil romper as relações com a Venezuela, a menos que o país vizinho adote essa medida drástica.
Já o professor Amâncio Jorge, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), entende que a estratégia do governo brasileiro é a de tentar "diminuir a temperatura". Ele, contudo, avalia que há o "risco" da ruptura diplomática em razão das medidas adotadas pelo regime de Maduro.
Hussein Kalout, conselheiro consultivo internacional do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), afirma que o Brasil adotou uma estratégia "equivocada" nas relações diplomáticas com a Venezuela desde que o presidente Lula tomou posse para o terceiro mandato.
Ele afirma ainda que o governo brasileiro "antecipou legitimidade em demasia" a Maduro, "elevou de forma muito rápida e sem a ponderação necessária" o prestígio do presidente venezuelano e buscou reintegrar o regime "achando que o Brasil teria influência, o que não se materializou".
Para Pio Pena Filho, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), o governo brasileiro tem uma oportunidade "de ouro" para se distanciar do governo de Nicolás Maduro.
Ele ressalta, porém, que a tradição diplomática brasileira é não desafiar nenhum governo e não "encarar" chefes de Estado.