Montezuma Cruz/Secom
Publicada em 16/06/2021 às 09h32
Quarenta anos de emancipação político-administrativa, 35,7 mil habitantes, 1,96 mil km²: Ouro Preto do Oeste também se originou da reforma agrária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que ali instalou o Projeto Integrado de Colonização Ouro Preto (PIC), o primeiro no extinto Território Federal de Rondônia.
Bovinos, peixes, arroz, feijão, indústrias, agroindústrias e o pujante comércio deixam bem distante a fase cacaueira do município. Isso se reflete nos depósitos bancários em poupança, que somavam R$ 191,3 milhões em 2020, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O Incra começou o PIC no dia 19 de junho de 1970, ano da Copa do Mundo no México, e assentou 5,16 mil famílias, cada qual recebendo um lote de 100 hectares de terras. O mosquito anofelino picava 24 horas, quase sempre colocando de 30 a 40 pessoas diariamente em redes, camas, ou, quando morriam, nas covas do cemitério.
Estimava-se o assentamento de apenas mil famílias, mas o projeto extrapolou, em consequência da migração desenfreada de famílias do sul e sudeste, rumo a Rondônia. A elas se somaram também outras que migraram de Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais.
Oito anos depois, a região colhia cacau de qualidade e programava sua primeira exportação que teve como destino Hamburgo (então Alemanha Ocidental). Foram apenas 500 sacas, cerca de 30 toneladas, conforme apurava na ocasião a Comissão Executiva do Plano da Lavoura (Ceplac).
O grupo Fischer, que comprava essa amêndoa, comemorava em seu escritório. O primeiro coordenador do PIC, engenheiro agrônomo, Assis Canuto (ex-prefeito de Ji-Paraná, ex-deputado federal e vice-governador do Estado) acreditava no êxito da lavoura, apesar dos percalços sofridos em consequência da disseminação do fungo da vassoura-de-bruxa (Crinipellis perniciosa), destruidor.
“Porto Velho seria um polo exportador”, previa Assis Canuto.
Antes da doença se espalhar pelos cacaueiros de Ouro Preto e Ariquemes, o grupo Fischer havia conseguido financiamento da antiga Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e pretendia beneficiar as safras aqui mesmo.
O fungo da vassoura-de-bruxa é um dos males fitopatológicos mais perigosos para o plantio brasileiro; ataca principalmente os brotos, formando manchas e causando perdas enormes na produção. Em alguns casos, destrói a produção inteira, como ocorreu nesses municípios que iniciaram o plantio do cacau em Rondônia, nos anos 1970.
Segundo a Ceplac, os frutos dessa planta nativa da Amazônia foi um dos produtos mais exportados do Brasil, chegando a proporcionar US$ 3 bilhões, 618 milhões (três bilhões, seiscentos e dezoito milhões de doláres) no período de 1975 a 1980. Os maiores produtores são os estados do Pará, cuja exportação de amêndoas em 2019 chegou a 1,2 milhão de dólares; Bahia, que exportou 619 mil dólares do produto em 2020.
A situação inverteu-se no ano passado: somente nos dois primeiros meses de 2020, a Bahia havia exportado US$ 414 mil, enquanto o Pará mandava para o exterior US$ 207 mil de amêndoas. Estima-se que até 2023, o Pará supere a Bahia em produção. Parceria entre Ceplac, Entidade Autárquica de Assistência Técnica e Extensão Rural de Rondônia (Emater) e Secretaria de Estado da Agricultura (Seagri), deverá possibilitar a Rondônia recuperar a produção cacaueira, hoje em torno de 12 mil hectares de cacau plantados, quase todos de plantas convencionais que aos poucos estão sendo substituídas pelas plantas clonais, com maior rendimento.
Bares e cinema eram os pontos de encontro dos ouro-pretenses nos anos 1970
TUDO ACONTECIA
NO CINEMA
O jornalista Roberto Gutierrez Rocha depõe: “Lembro como se fosse hoje, 1973, à luz de vela, não havia luz elétrica na Sapolândia”.
O pai de Roberto, seu Agenor Rocha, que viveu 93 anos, foi proprietário do primeiro cinema da cidade, cujos projetores de 35 milímetros inauguraram o Cine Lacerda, em Porto Velho.
Afora a programação de faroestes, comédias e aventuras na selva, o salão do cinema marcou época com outra finalidade, recorda o jornalista: “Todas as reuniões importantes políticas da época, desde a instalação dos distritos, do município, à posse dos eleitos, mais as reuniões do (governador) Teixeirão, lançamentos do Projeto Mutirão, da própria Companhia de Desenvolvimento de Rondônia (Codaron), as primeiras sessões da Câmara dos Vereadores, tudo acontecia no cinema, e meu pai nunca cobrou nada por isso, nem mesmo o combustível usado para funcionar o motor de energia elétrica”.
PIONEIROS QUASE ANÔNIMOS
Segundo Roberto Rocha a plantação das mudas de cacau na Estação Experimental da Ceplac fora coordenado pelo agrônomo Frederico Álvares Affonso, e as fotos desse período ficaram algum tempo guardadas na Escola Isolada Doutor Joaquim de Lima Avelino. “Nelas estão muitos heróis anônimos que morreram lutando para garantir um pedaço de terra onde os inimigos não eram latifundiários, mas as doenças tropicais, entre elas, a malária, e os acidentes causados por derrubadas”.
Antes de receber o lote, migrantes acampavam em barracas cobertas de lona
“Muitos morreram esmagados por árvores em derrubadas, famílias inteiras dizimadas pela malária, uma história de muitos órfãos que hoje são avós”, conta o jornalista.
O ponto comercial mais importante era a cantina do capitão Sílvio de Farias, na entrada de Ouro Preto, onde eram distribuídos os mantimentos para as equipes que abriram as primeiras estradas vicinais. Eram dois acampamentos: do Machado e do Miache.
PERSONAGENS POLÍTICOS
“Trabalhavam ali os conhecidos Comara, Caribamba, Capixaba, Ezequiel, Quito, Agenor Nogueira da Rocha, Zefirino, e tantos mais que minha memória de um garoto de 13 anos não conseguiu guardar. A primeira linha aberta foi a 22, e nela morava o paranaense (de Ubiratã) João Dias, que foi vereador em Porto Velho e mais tarde deputado estadual pelo MDB”, lembra Gutierrez
Enquanto as linhas vicinais eram abertas – 1970 – o Incra, coordenado pelo agrônomo Assis Canuto, era o responsável pelo assentamento das famílias em lotes de 100 hectares.
Palmeiras já enfeitavam avenida (BR-364) nos anos 1980
O jornalista se lembra dos integrantes da equipe de Canuto: Ademar da Costa Sales, Praça Ferreira, Doutor Julimar Militão, Morluf, Augustinho Peniche, Nunoi Itsumi (depois prefeito de Ji-Paraná), Antônio Cunha, Eustáquio, Bosco, Paulo Brandão (do Incra); os guardas florestais Célio, Amaurino, Soares (empresário em Jaru) e Peniche; técnicos agrícolas Francisco Sales Duarte de Azevedo (depois, prefeito de Ariquemes e deputado federal), Genivaldo Souza (foi deputado estadual), Demerval Baiano da Ceplac, Professor Junqueira, pioneiro no plantio de café; Itabaiana, Adalberto da Ceplac, Barbosa, seu Oliveira…
E, ainda, dos motoristas e comerciantes: Nilo, Nelson Baracho, Raimundo da Cruz Teixeira, seu Agenor da Rocha, Alemão Preto, Vicentão, Manezinho Rocha, Zezé, Badé, e do tratorista Chico Parafuso, entre outros mais.
Parte desses personagens por ele citados já morreu, e o restante se aposentou. Todos chegaram a Ouro Preto de 1970 a 1973.
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