Rondoniadinamica
Publicada em 31/03/2022 às 08h43
Porto Velho, RO – O juiz de Direito Paulo José do Nascimento Fabrício, da 2ª Vara Cível de Guajará-Mirim, condenou o casal Bento em ação popular movida por cidadão da cidade.
Cabe recurso.
A prefeita Raíssa da Silva Paes, do MDB, e seu marido Antônio Bento do Nascimento, foram sentenciados pelo Juízo na última quarta-feira (30).
O magistrado reconheceu a ausência de requisitos legais para o exercício de cargo público declarando a ilegalidade da nomeação de Antônio Bento do Nascimento, “companheiro da prefeita Raíssa da Silva Paes, para ocupar a Secretaria de Obras deste Município de Guajará-Mirim”.
Isto, a despeito de o sentenciado já ter sido desligado da pasta.
Nascimento Fabrício ainda condenou a dupla “ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, em valor equivalente à 06 (meses) meses de remuneração do cargo, para cada um dos réus, acrescidos de correção monetária e juros, ambos desde a data da citação”.
Em seguida, pontuou:
“Por outro lado, deixo de condenar o Município de Guajará-Mirim, tendo em vista que a nomeação ao cargo de secretário municipal é ato administrativo exclusivo do Chefe do Poder Executivo [...]”.
E concluiu condenando Raíssa da Silva Paes e Antônio Bento do Nascimento ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, “os quais, ante a relevância da situação posta em juízo, fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais) que será partilhado solidariamente pelos requeridos”, concluiu.
VEJA A DECISÂO:
Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia Fórum Nelson Hungria - Avenida 15 de Novembro, n. 1981, Bairro: Serraria, CEP: 76850-000 Guajará-Mirim/RO E-mail: [email protected] Guajará-Mirim - 2ª Vara Cível Processo: 7000618-54.2021.8.22.0015 Classe/Assunto: Ação Popular/ Violação aos Princípios Administrativos Distribuição: 11/03/2021 AUTOR: AURISON DA SILVA FLORENTINO, CPF nº 28572068287, AV. 15 DE NOVEMBRO 2000 SERRARIA - 76850-000 - GUAJARÁMIRIM - RONDÔNIA ADVOGADO DO AUTOR: AURISON DA SILVA FLORENTINO, OAB nº RO308B
REU: MUNICÍPIO DE GUAJARÁ MIRIM, AV. 15 DE NOVEMBRO 930 CENTRO - 76850-000 - GUAJARÁ-MIRIM - RONDÔNIA, ANTONIO BENTO DO NASCIMENTO, CPF nº 20418760268, AV. PRINCESA 2518 SANTA LUZIA - 76850-000 - GUAJARÁ-MIRIM - RONDÔNIA, RAISSA DA SILVA PAES, CPF nº 01269722220, AV. PRINCESA ISABEL 2518 SANTA LUZIA - 76850-000 - GUAJARÁ-MIRIM - RONDÔNIA ADVOGADOS DOS REU: JOSE DE ALMEIDA JUNIOR, OAB nº RO1370, - 76800-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, CARLOS EDUARDO ROCHA ALMEIDA, OAB nº RO3593, EDUARDO BELMONTH FURNO, OAB nº RO5539A, , - DE 8834/8835 A 9299/9300 - 76800-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, ADEMIR DIAS DOS SANTOS, OAB nº RO3774, AV. COSTA E SILVA 1700, CASA CENTRO - 78937-000 - NÃO INFORMADO - ACRE, DIVANILCE DE SOUSA ANDRADE, OAB nº RO8835, AV. CALAMA 4155 EMBRATEL - 76800-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM
SENTENÇA
Trata-se de ação popular ajuizada por AURISON DA SILVA FLORENTINO contra MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM, RAÍSSA DA SILVA PAES e ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO. Aduz o autor que a prefeita RAÍSSA DA SILVA PAES nomeou seu companheiro ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO ao cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Público, conforme decreto n. 13.126/2021, de 8 janeiro de 2021, com efeito retroativo a 1º de janeiro de 2021 (ID 55494390 - Pág. 1), e que esta nomeação afronta a Súmula Vinculante 13 do Supremo Tribunal Federal, além de violar princípios constitucionais de razoabilidade, moralidade administrativa, impessoalidade e isonomia. Relata que ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO está com seus direitos políticos suspensos, devido à prática reiterada de atos de improbidade administrativa contra a Fazenda Pública Municipal, que ostenta condenação criminal pelos crimes de embriaguez ao volante, invasão de domicílio qualificado e lesão corporal simples (ação penal n. 0000804-46.4014.8.22.0015) e possui dívida com MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM/RO de R$ 1.147.845,43 (um milhão e cento e quarenta e sete mil e oitocentos e quarenta e cinco reais e quarenta e três centavos), decorrente de dano ao erário municipal (processo de execução n. 0000230-57.2013.8.22.0015 que tramita na 1ª Vara Cível de Guajará-Mirim).
Alega que esses fatos impedem ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO de exercer cargo público, pois não cumpre o requisito básico para ingresso no serviço público, previsto no art. 6º, inciso II, da Lei n. 347/1990 (Estatuto dos Funcionários do Município de Guajará-Mirim), bem como no art. 64 da Lei Orgânica do Município. Pugnou pela concessão da liminar para determinar o afastamento de ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO do cargo que nomeado. No mérito, postula pela confirmação da liminar e, consequentemente, anulação da nomeação de ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO, além da condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). A liminar foi deferida para suspender os efeitos do Decreto 13.126/2021, publicado em 8 de janeiro de 2021, que nomeou ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO para o cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos (decisão de ID 55517110 - Pág. 1). O Ministério Público foi devidamente intimado, nos termos do art. 7º, inciso I, alínea “a”, da Lei 4.717/1965. Posteriormente, o autor requereu fixação de multa em caso de descumprimento da decisão judicial. Citados, o MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM informou que interpôs agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo em face da liminar deferida.
O réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO, por sua vez, ofereceu contestação. Alega que não há afronta à Súmula Vinculante 13, pois o cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos exerce função típica de agente político. Argumenta que está quite com a Justiça Eleitoral, absolutamente elegível, portanto, pugna pela improcedência dos pedidos. Posteriormente, o autor reiterou o pedido de fixação de multa por descumprimento da liminar. Entretanto, o referido pedido foi indeferido. O MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM e a prefeita RAÍSSA DA SILVA PAES depois ofereceram contestação. Preliminarmente, alegaram inépcia da inicial, em razão da falta de causa de pedir. Sustentam que a nomeação de parente ao cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos não é alçada pela vedação prevista na Súmula Vinculante 13.
Aduzem inépcia da inicial em razão do ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO estar quite com a Justiça Eleitoral, portanto, pugna pela improcedência dos pedidos. Houve réplica. Instadas as partes a especificar as provas pretendidas, nada requereram. O processo foi saneado e fixado os pontos controvertidos da demanda (decisão ID 60240007 - Pág. 1-2). Em seguida, sobreveio informação acerca da decisão que indeferiu o efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto pelo MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM até o julgamento do mérito (ID 61246974 - Pág. 1-6). Intimadas as partes a especificar as provas que pretendiam produzir (ID 62290748), o Ministério Público pleiteou pela fixação de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) aos réus, pelo descumprimento da decisão que determinou a suspensão dos efeitos do decreto n. 13.126/2021 (ID 62566250 - Pág. 1-2). O MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM noticiou a exoneração do réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO do cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Público (ID 62782371), por meio do Decreto n. 13.748/GABPREF/2021, de 27 de setembro de 2021 (ID 62782372).
O Ministério Público juntou certidões de antecedentes criminais emitidas em nome de ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO; certidão do Tribunal Regional Eleitoral do Estado Rondônia em que consta que foram restabelecidos apenas os direitos ativos de ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO, contudo permanece suspensa a capacidade eleitoral passiva; além de certidão positiva emitida pelo Tribunal de Contas do Estado de Rondônia em que consta restrição em nome de ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO, referente à débitos e multas; e pugna pela procedência da inicial (IDs 68957213, 68957219, 68957220, 68957221, 68957221 e 68957222). Intimados acerca dos documentos apresentados pelo Ministério Público, os réus RAÍSSA DA SILVA PAES e ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO pugnaram pela revisão da liminar que suspendeu os efeitos do Decreto 13.126/2021, publicado em 8 de janeiro de 2021, que nomeou ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO para o cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Públicos, para possibilitar o retorno de ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO ao cargo para o qual foi nomeado (ID 73956416).
É o relatório. Decido.
O processo está em ordem, não havendo preliminar ou irregularidade a ser sanada. Todos os pressupostos processuais de desenvolvimento válido e regular do processo se fazem presentes e o feito está apto a receber o julgamento do mérito. Inicialmente, cumpre ressaltar que a ação popular é o meio processual colocado à disposição de qualquer cidadão para questionar judicialmente a validade de atos que considere lesivos “ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência” (inciso LXXIII do art. 5º da Constituição Federal). A Constituição Federal prevê mandamentos à administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios ao dispor que devem obedecer aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência na conduta administrativa (caput do art. 37). Os preceitos de moralidade e da impessoalidade exigem que atuação administrativa, além de respeitar a lei, seja ética, leal e séria, devendo dispensar tratamento impessoal e isonômico aos particulares, bem como a proibição de promoção pessoal. Os princípios constitucionais fundamentaram a edição pelo Supremo Tribunal Federal da Súmula Vinculante 13, que dispõe sobre a proibição do nepotismo ipsis litteris “A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.”
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Reclamação 29033 AgR/RJ, de relatoria do Ministro Roberto Barroso, decidiu que, mesmo na situação de cargos políticos, será possível considerar indevida a nomeação nas hipóteses de nepotismo cruzado; fraude à lei e inequívoca falta de razoabilidade da indicação, por inidoneidade moral ou manifesta ausência de qualificação técnica do nomeado (STF. 1ª Turma. Rcl 29033 AgR/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/9/2019 (Info 952). Assim, as nomeações para o cargo de natureza política devem observar o princípio expressos na constituição e da razoabilidade levandose em consideração as condições técnicas e pessoais dos nomeados, sob pena de caracterizar o nepotismo. No presente caso, a ré prefeita RAÍSSA DA SILVA PAES nomeou seu companheiro, o réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO, ao cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Público, conforme Decreto n. 13.126/2021, de 8 janeiro de 2021, com efeito retroativo a 1º de janeiro de 2021 (ID 55494390 - Pág. 1). Cumpre ressaltar que, embora não conste nos autos certidão de casamento ou declaração de união estável dos réus RAÍSSA DA SILVA PAES e ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO, a convivência das partes é de conhecimento público e sequer foi discutida nos autos. Acerca do cargo comissionado, a Lei Orgânica do Município de Guajará-Mirim acostada sob o ID 55495269 - Pág. 1-58 prevê que os secretários municipais serão escolhidos dentre brasileiros maiores de 18 anos, no exercício dos direitos políticos (caput do art. 64). Além dessa condição para nomeação ao cargo de secretário municipal, dispõe que qualquer cidadão que for investido em cargo de confiança ou comissionado, apresentará certidões cartoriais, provando sua conduta imaculável e sua reputação ilibada (§ 1º do art. 64). No mesmo diploma legal, consta que quando do ato da posse, o secretário municipal fará declaração de bens e apresentará certidão negativa de débitos para com a fazenda pública e, ao final do mandato, nova declaração de bens deverá ser apresentada (art. 66). Sobre os servidores públicos, a Lei n. 347/90 (Estatuto dos Servidores do Município de Guajará-Mirim) acostada sob o ID 55495258 - Pág. 1-43 prevê os requisitos básicos para ingresso no serviços público, quais são, cumulativamente, nacionalidade, gozo dos direitos políticos, quitação com as obrigações militares e eleitorais, idade mínima de 18 anos, observados o disposto no inciso XXXIII do art. 7º da CF (art. 6º, inciso I a IV). Em análise aos documentos acostados nos autos, verifico que mesmo após o despacho saneador (ID 60240007), em que fixei ponto controvertido acerca da qualificação técnica do réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO para chefiar a Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos, não há nos autos qualquer justificativa de natureza profissional, curricular ou técnica para a prefeita RAÍSSA DA SILVA PAES ter nomeado seu companheiro ao cargo de secretário municipal. Na contestação de ID 57615897 - Pág. 1-12, a ré RAÍSSA DA SILVA PAES limitou-se a defender que a nomeação de parentes para exercer cargo de natureza política não é alcançada pela vedação ao nepotismo prevista na Súmula Vinculante 13 do Supremo Tribunal Federal. Cabia à prefeita RAÍSSA DA SILVA PAES o ônus de comprovar que seu companheiro ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO possui qualificação técnica e, assim, defender a razoabilidade da nomeação dele ao cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Público. Entretanto, não argumentou acerca dessa questão, bem como não apresentou documentos mínimos que pudessem justificar a escolha.
Anoto, por importante, que não se pode nem argumentar que ANTÔNIO BENTO possuía capacitação anterior por já ter assumido anteriormente a gestão do município, na qualidade de prefeito, posto que é patente que durante tal gestão foi processado e condenado por improbidade administrativa, fato que por si só macula qualquer alegação de capacidade técnica posto que, ao contrário, denota avanço ilegal do requerido no erário. Cumpre ressaltar que o Tribunal de Justiça de Rondônia tem decidido acerca da necessidade de demonstração de qualificação condizente com o cargo nomeado, conforme recente julgado: AGRAVO INTERNO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CARGO POLÍTICO. NOMEAÇÃO. PARENTE. NEPOTISMO. AUSÊNCIA DE QUALIFICAÇÃO TÉCNICA. FUMAÇA DO BOM DIREITO. REQUISITO AUSENTE. RECURSO NÃO PROVIDO.
O entendimento dos Tribunais superiores é de que a nomeação de parentes sem qualificação técnica para cargos políticos configura nepotismo, salvo se demonstrado, no caso concreto, a razoabilidade da contratação. No caso, não se mostra presente a fumaça do bom direito na nomeação do esposo da vice-prefeita para cargo de secretário-chefe de gabinete e que possui apenas o ensino fundamental, sem a demonstração de qualificação condizente, mormente quando sequer juntado ao writ o inquérito que ensejou a recomendação do Parquet pela exoneração. (MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL 0803721-74.2019.822.0000, Rel. Des. Roosevelt Queiroz Costa, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia: 2ª Câmara Especial, julgado em 15/02/2022.)
Verifico no ID 68957221 - Pág. 18, que consta ofício do Juiz Eleitoral Jaires Taves Barreto que, em resposta ao ofício do Ministério Público, informou que estão suspensos os direitos políticos com relação à capacidade eleitoral passiva do réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO. Ou seja, foi permitido pela Justiça Eleitoral que o requerido ANTÔNIO BENTO votasse, mas, tal decisão não lhe restituiu integralmente os direitos políticos, isto é, permaneceu íntegra a decisão quanto à inelegibilidade, que é direito de ser votado, em razão dos efeitos previstos pelo art. 1º, inciso I, alínea “e”, da Lei Complementar n. 64/90. Na oportunidade, transcrevo o dispositivo legal: “ Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer cargo: (...) e) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes: (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010)” Embora o documento não conste especificamente por qual(ais) crime(s) o réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO foi condenado, é indiscutível que houve condenação transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, fato que lhe tornou inelegível para qualquer cargo, tanto que sequer argumentou sobre essa questão. Apesar do acesso ao cargo de Secretário Municipal não ocorrer por meio de eleição (sufrágio universal, voto direto e secreto) e a escolha ser de forma livre e pessoal do Chefe do Poder Executivo do Município, o agente escolhido para o cargo possui função política e temporária, e exercerá um munus público. Sobre o conceito de agente político, transcrevo parte da abordagem do eminente doutrinador em Direito Administrativo Celso Antônio Bandeira de Mello: “Agente políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização política do país, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São agentes Políticos apenas o Presidente da República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes de Executivo, isto é, Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados federais e estaduais e os Vereadores. O vínculo que tais agentes entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza política.
Exercem um munus público. Vale dizer, o que os qualifica para o exercício das correspondentes funções não é a habilitação profissional, a aptidão técnica, mas a qualidade de cidadãos, membros das civitas e, por isto, candidatos possíveis à condução dos destinos da Sociedade. A relação jurídica que os vincula ao Estado é de natureza institucional, estatutária. Seus direitos e deveres não advêm de contrato travado com o Poder Público, mas descendem diretamente da Constituição e das leis. Donde, são por elas modificáveis, sem que caiba procedente oposição às alterações supervenientes, sub color de que vigoravam condições diversas ao tempo das respectivas investiduras.” (Mello, Celso Antônio Bandeira de - Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros: 32ª ed. 2015 - Pág. 253-254, sem grifo no original) Assim, o exercício do cargo de natureza política está restrito ao cidadão em pleno gozo de direitos políticos. Ocorre que, no presente caso, o réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO nomeado pela prefeita ao cargo de Secretário Municipal não está em pleno gozo de seus direitos políticos, pois está inelegível para qualquer cargo, nos termos do art. 1º, inciso I, alínea “e”, da Lei Complementar n. 64/90, conforme consta no documento de ID 68957221 - Pág. 18, da lavra do Juízo Eleitoral, fato que demonstra que a malfadada nomeação se desviou, inequivocamente, do princípio constitucional da moralidade administrativa e da impessoalidade. Acerca da inelegibilidade transcrevo os ensinamentos do eminente doutrinador de Direito Constitucional José Afonso da Silva: “Inelegibilidade revela impedimento à capacidade eleitoral passiva (direito de ser votado). Obsta, pois, à elegibilidade. Não se confunde com a inalistabilidade, que é impedimento à capacidade eleitoral ativa (direito de ser eleitor), nem com a incompatibilidade, impedimento ao exercício do mandato depois de eleito. As inelegibilidades têm por objeto proteger a probidade administrativa, a normalidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta (art. 14, § 9º). Entenda-se que a cláusula “contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função...” só se refere à normalidade e à legitimidade das eleições. Isso quer dizer que a “probidade administrativa” e a “moralidade para o exercício do mandato” são valores autônomos em relação àquela cláusula; não são protegidos contra a influência do poder econômico ou abuso de função etc., mas como valores em si mesmos dignos de proteção, porque a improbidade administrativa e imoralidade, aí, conspurcam só por si a lisura do processo eleitoral. As inelegibilidades possuem, assim, um fundamento ético evidente, tornando-se ilegítimas quando estabelecidas com fundamento político ou para assegurarem o domínio do poder por um grupo que o venha detendo, como correu no sistema constitucional revogado. Demais, seu sentido ético correlaciona-se com a democracia, não podendo ser entendido como um moralismo desgarrado da base democrática do regime que se instaure.” (Silva, José Afonso da - Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros: 16ª ed. 1999 - Pag. 389, sem grifo no original) Dessa forma, é incontestável que o réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO não está em pleno gozo de direitos políticos e, por consequência, demonstrada está a inequívoca falta de razoabilidade na sua nomeação ao cargo político por manifesta inidoneidade moral, mesmo em se tratando de cargo político, conforme anotada no Rcl 29033 AgR/RJ, da relatoria do Ministro Roberto Barroso, julgado em 17/9/2019. Observo que, no decorrer do feito, especificamente após 6 meses do ajuizamento desta ação, a ré RAÍSSA DA SILVA PAES exonerou o réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO do cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Público, por meio do Decreto n. 13.748/ GAB-PREF/2021, de 27 de setembro de 2021 (ID 62782372).
Portanto, apesar de não haver possibilidade de anular o ato que já não existe mais ante a exoneração ocorrida, faz-se necessário declarar a ilegalidade da nomeação do réu ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO ao cargo de Secretário Municipal de Obras e Serviços Público, realizada pela ré RAÍSSA DA SILVA PAES, uma vez que o ato praticado pela prefeita violou os princípios que regem a administração pública, especialmente moralidade e impessoalidade, bem como evidenciado o dolo, pois como companheira do réu, sempre teve conhecimento da inidoneidade moral, diante da suspensão dos direitos políticos do réu.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a presente ação popular para: a) RECONHECER a ausência de requisitos legais para o exercício de cargo público e DECLARAR A ILEGALIDADE da nomeação de ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO, companheiro da prefeita RAÍSSA DA SILVA PAES, para ocupar a Secretaria de Obras deste Município de Guajará Mirim; b) CONDENAR os réus RAÍSSA DA SILVA PAES e ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, em valor equivalente à 06 (meses) meses de remuneração do cargo, para cada um dos réus, acrescidos de correção monetária e juros, ambos desde a data da citação.
Por outro lado, deixo de condenar o MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM, tendo em vista que a nomeação ao cargo de secretário municipal é ato administrativo exclusivo do Chefe do Poder Executivo e, portanto, não há razão para condenar a Fazenda Pública notadamente porque, como já reiteradamente afirmado por este juízo, o dano moral coletivo somente tem seu fundamento de validade quanto fixado em desfavor do particular em benefício do ente público porque, por certo, fixar dano moral coletivo em face do ente público, como beneficiário o próprio ente público, representa um nada, independentemente de quem seja o beneficiário ou executor final do montante aplicado, vez que obrigatoriamente a pecúnia deverá ser aplicada em benefício público. Por fim, julgo extinta a ação popular com apreciação de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno os réus RAÍSSA DA SILVA PAES e ANTÔNIO BENTO DO NASCIMENTO ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais, ante a relevância da situação posta em juízo, fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais) que será partilhado solidariamente pelos requeridos. Por fim, ante o evidente prejuízo ao erário, isento o MUNICÍPIO DE GUAJARÁ-MIRIM das verbas de sucumbência.
Sentença publicada e registrada automaticamente. Transitada em julgado, arquivem-se os autos. Intimem-se.
Guajará-Mirim, quarta-feira, 30 de março de 2022
PAULO JOSÉ DO NASCIMENTO FABRÍCIO
Juiz de Direito Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia Fórum Nelson Hungria - Av. 15 de Novembro, N. 1981,
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