AFP
Publicada em 03/06/2022 às 10h03
Há apenas quatro anos, as mulheres sauditas nem podiam dirigir. Agora, um grupo de mulheres vai mais longe e aprende a consertar veículos em uma oficina de Jidá, desafiando os costumes de um reino ainda muito conservador.
Embora o governo afirme encorajar as mulheres a trabalhar, a incursão feminina em um setor como o mecânico, dominado por homens na Arábia Saudita e em grande parte do mundo, nem sempre é bem-vinda.
Ghada Ahmad trabalha na oficina Petromin Express, que tem outras quatro funcionárias. Recentemente, um cliente ordenou que todas as mecânicas saíssem e ficassem longe de seu carro, conta.
"No começo, é normal que não confiem porque sou mulher", diz essa mecânica de trinta e poucos anos, vestida de macacão azul e luvas brancas manchadas de óleo.
"É algo novo para eles. Depois de anos vendo apenas homens", ressalta.
À medida que aprendia o básico, como verificar o nível do óleo ou trocar os pneus, foi assaltada por dúvidas. "Cheguei em casa com as mãos inchadas e chorei dizendo para mim mesma: 'esse trabalho não é para mim, eles estão certos'", explica.
Mas as habilidades adquiridas e os comentários encorajadores de outros clientes fortaleceram sua confiança.
"Um homem me disse: 'Estou muito orgulhoso de você. Você nos honra'", lembra a jovem, que está especialmente feliz com esse trabalho por causa da interação com os clientes.
A Petromin, grande empresa de serviços automotivos que possui a oficina em Jidá, não hesita em promover essa integração.
Seu vice-presidente, Tariq Javed, estima que "esta iniciativa incentivará mais mulheres a ingressar na indústria automotiva em todos os níveis".
- Permissão do marido -
A integração das mulheres na esfera pública faz parte da "Visão 2030", a estratégia do príncipe herdeiro Mohamed bin Salman para restaurar a controversa imagem de seu país e diversificar uma economia extremamente dependente do petróleo.
Em 2018, as mulheres sauditas foram autorizadas a dirigir após uma proibição de décadas.
A concessão desses tipos de direitos, porém, anda de mãos dadas com uma repressão implacável contra as ativistas feministas que os reivindicam.
O país também relaxou as regras de "tutela" que regem a autoridade que os homens exercem sobre as mulheres de sua família.
Todos as mecânicas de Jidá garantem que jamais teriam trabalhado sem o consentimento do marido.
Antes de se candidatar, Ola Flimban, de 44 anos, era dona de casa e pediu a opinião do marido, Rafat, que a ajudou a se preparar para a entrevista e memorizar o nome das peças.
Na oficina, Ola também deve enfrentar os clientes mais céticos. "Eles ficam surpresos com o fato de haver mulheres que trabalham nessa área e nos perguntam como nos apaixonamos pelo trabalho. Essa é a pergunta mais comum", diz.
A feminização da oficina agrada as clientes, que ficam mais relaxadas do que conversando com um homem, diz Angham Jeddawi, funcionária de 30 anos.
Para ela, fazer esse trabalho é realizar o sonho de uma vida, que antes acreditava ser impossível.
"Meu sonho era entrar no setor automotivo, mas para uma mulher saudita isso não era possível. Então, quando surgiu a oportunidade, me candidatei imediatamente", conta.
Essa experiência também a incentivou a dirigir e ela está estudando para obter uma licença. "Agora, se houver algum problema na estrada, saberei como reagir", comenta.
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