AFP
Publicada em 28/10/2022 às 14h57
Crises ligadas às guerras, às catástrofes climáticas e à pandemia de covid-19 abalaram os sistemas alimentares globais e mergulharam milhões de pessoas na fome e na pobreza.
A questão estará na mesa da próxima conferência climática da ONU, a COP27, no início de novembro em Sharm el-Sheikh, Egito.
Inundações, secas e ondas de calor atingem plantações na Europa e na Ásia e ameaçam de fome o Chifre da África.
Especialistas também alertam que isso pode ser apenas o começo.
"Se não agirmos agora, é apenas uma amostra do que virá", diz Mamadou Goita, do grupo IPES-Food, que trabalha com organizações de agricultores, principalmente na África.
A produção de alimentos é uma atividade com emissões significativas de gases de efeito estufa e altamente exposta às mudanças climáticas.
Alguns desses impactos são de longo prazo, como rendimentos mais baixos das terras, aquecimento dos oceanos, mudanças sazonais entre polinizadores e plantas ou calor excessivo no trabalho agrícola.
Mas outros já devem estar incluídos entre os atuais fatores de risco.
As inundações podem causar "devastação súbita de meios de subsistência e infraestruturas", exemplifica Rachel Bezner Kerr, professora da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, e principal autora deste relatório do grupo de especialistas climáticos da ONU (IPCC).
- "Frenesi" especulativo -
O ano de 2022 registra exemplos dramáticos.
A onda de calor afetou as colheitas no sul da Ásia e a seca devastou as colheitas na Europa.
As inundações afogaram os arrozais na Nigéria e na China, onde a seca atingiu a bacia do rio Yangtze, que abriga um terço das terras aráveis do país.
A crise atinge os mais vulneráveis.
Cerca de 22 milhões de pessoas estão ameaçadas pela fome no Quênia, Somália e Etiópia, após quatro estações chuvosas... sem chuva, de acordo com o Programa Mundial de Alimentos da ONU.
No Paquistão, inundações de monções sem precedentes engoliram grandes áreas de terras agrícolas.
Os desastres climáticos podem levar a restrições de exportação, como as impostas pela Índia este ano depois que sua colheita de trigo sofreu com a onda de calor.
A especulação e a crise energética causadas pela guerra na Ucrânia só pioraram a situação, elevando os preços dos grãos.
Uma parte das soluções é monetária, principalmente para pequenos agricultores na "linha de frente" das mudanças climáticas e da insegurança alimentar, diz Claire McConnell, do think tank E3G.
Mas eles recebem apenas 2% da ajuda para as mudanças climáticas, segundo o especialista.
Outra questão importante é a redução das emissões, já que a produção de alimentos será "impossível" em determinadas regiões se o aquecimento permanecer na trajetória atual, segundo o IPCC.
Redirecionar bilhões de dólares em subsídios agrícolas que prejudicam o meio ambiente e o clima seria um excelente começo, opina o professor Bezner Kerr.
Os habitantes dos países ricos poderiam, por sua vez, reduzir o consumo de carne e, portanto, o uso de cereais como ração para o gado, com os quais a pecuária deixaria de avançar em detrimento das florestas.
E todos os países poderiam diversificar sua dieta além do arroz, milho, trigo e batata que compõem a dieta usual.
Mas essas soluções têm seus limites. Hoje não existem variedades de cereais capazes de resistir às intempéries cada vez mais frequentes e destrutivas e aos desastres que assolam o planeta.
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