Rondoniadinamica
Publicada em 31/08/2024 às 09h17
Isonomia: igualdade perante a lei, que significa tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual na medida das suas desigualdades.
Porto Velho, RO – Em uma democracia ideal, todos os candidatos deveriam ter as mesmas oportunidades de se comunicar com o eleitorado, defender suas propostas e, assim, disputar em condições de igualdade. Contudo, as eleições municipais em Porto Velho revelam um cenário que, apesar de democrático em sua essência, é profundamente desigual em sua execução. A disparidade de recursos financeiros e o tempo de televisão destinados às campanhas eleitorais ilustram uma realidade onde candidaturas de pequeno porte enfrentam desafios quase insuperáveis para se destacarem diante de concorrentes com maiores aportes financeiros e privilégios midiáticos.
O tempo de televisão, um dos principais meios de comunicação de massa no Brasil, tem um impacto direto na capacidade dos candidatos de alcançar o eleitorado. Em Porto Velho, a distribuição desse tempo entre os candidatos à prefeitura é reveladora das desigualdades presentes no processo eleitoral.
Mariana Carvalho, do União Brasil, por exemplo, contará com impressionantes 11 minutos e 20 segundos de exposição televisiva. Este tempo exorbitante permite à candidata não só apresentar suas propostas detalhadamente, mas também construir uma narrativa consistente ao longo da campanha. Em contrapartida, Benedito Alves, do Solidariedade, terá apenas 34 segundos. Um tempo insuficiente até mesmo para apresentar suas principais ideias, quanto mais para convencer os eleitores de que sua candidatura merece atenção.
Samuel Costa, da Rede Sustentabilidade, terá 50 segundos, enquanto Célio Lopes, do PDT, contará com 4 minutos e 22 segundos. Euma Tourinho, do MDB, e Léo Moraes, do Podemos, terão respectivamente 1 minuto e 50 segundos e 58 segundos, deixando clara a desproporção. Ricardo Frota, do Novo, por sua vez, não terá qualquer tempo de televisão, uma vez que seu partido não ultrapassou a cláusula de barreira estabelecida pela legislação.
Essa distribuição desigual do tempo de televisão levanta questionamentos sobre a justiça do processo eleitoral. Em uma disputa onde a visibilidade é crucial, candidatos com menor tempo de exposição são automaticamente colocados em uma desvantagem significativa. A capacidade de um candidato comunicar suas propostas de forma eficaz ao eleitorado é severamente limitada por essa disparidade, criando um campo de jogo que está longe de ser nivelado.
Outro fator crítico que acentua a desigualdade entre as candidaturas é o financiamento de campanha. Em Porto Velho, os valores arrecadados pelos candidatos à prefeitura variam drasticamente, refletindo as diferentes capacidades de mobilização financeira de cada um.
Mariana Carvalho, mais uma vez lidera, com uma arrecadação de R$ 3,91 milhões, seguida por Célio Lopes, com R$ 2,04 milhões, e Léo Moraes, com R$ 1,5 milhão. Esses recursos, oriundos em grande parte dos diretórios nacionais de seus respectivos partidos, garantem que essas candidaturas possam investir em campanhas robustas, abrangendo desde a produção de material de campanha até a contratação de profissionais especializados em marketing político.
Em contrapartida, Euma Tourinho arrecadou R$ 184.250,00, Benedito Alves autofinanciou sua campanha com R$ 95 mil, enquanto Ricardo Frota e Samuel Costa ainda não declararam receitas significativas. Essa discrepância no financiamento ilustra mais uma vez como a competição entre os candidatos é desequilibrada. Sem recursos adequados, as campanhas menores lutam para ganhar visibilidade e atrair o apoio dos eleitores, ficando muitas vezes limitadas a esforços de base e redes sociais, onde o alcance é mais restrito.
A disparidade não se limita às candidaturas majoritárias. Na disputa pelas cadeiras na Câmara Municipal de Porto Velho, o cenário é igualmente preocupante. Breno Mendes, do Avante, recebeu R$ 200 mil da direção nacional de sua legenda, tornando-se o candidato mais bem financiado até o momento. José Uilson Guimarães de Souza, o Zé Paroca, do mesmo partido, segue de perto com R$ 186 mil. Esses valores, oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, destacam como determinados candidatos já partem com uma vantagem significativa, capaz de influenciar diretamente suas chances de eleição.
Outros candidatos, com menos apoio financeiro, enfrentam uma luta ainda mais árdua. Sem os recursos necessários, suas campanhas dependem muito mais de esforço individual e voluntariado, enquanto candidatos mais financiados podem investir em estratégias de comunicação mais eficazes, como publicidade paga e material de campanha de maior qualidade.
O cenário eleitoral em Porto Velho levanta uma questão crucial sobre a natureza da democracia brasileira: até que ponto a competição política é justa quando o acesso a recursos e a tempo de mídia é tão desigual? A democracia, como está atualmente estruturada, acaba por favorecer aqueles que já possuem poder e influência, criando barreiras quase intransponíveis para novas vozes e ideias que buscam se estabelecer.
Entretanto, é fundamental ressaltar que os candidatos que usufruem desses benefícios não estão agindo fora da legalidade. Pelo contrário, estão utilizando os recursos que a legislação permite e a estrutura partidária possibilita. Não se pode culpá-los por organizar suas campanhas da forma mais eficaz possível. O problema reside nas próprias regras do jogo, que perpetuam e até exacerbam as desigualdades.
A perpetuação desse modelo eleitoral levanta preocupações sobre o futuro da democracia no Brasil. Se o sistema não for reformado para proporcionar uma competição mais justa, corremos o risco de ver a consolidação de uma classe política elitizada, desconectada das realidades e das necessidades dos eleitores comuns. A correção desse desequilíbrio é, portanto, não apenas desejável, mas essencial para a saúde da democracia brasileira.
Enquanto isso, candidatos menores continuarão a enfrentar a batalha desigual com "cara e coragem", enquanto seus concorrentes bem financiados e com amplo tempo de televisão largam na frente, beneficiando-se de uma estrutura que, embora legal, é inegavelmente prejudicial à equidade democrática.
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