G1
Publicada em 21/09/2024 às 09h42
O Conselho Eleitoral do Estado da Geórgia aprovou nesta sexta-feira (20) uma nova regra exigindo que fiscais eleitorais contem manualmente as cédulas de papel após a conclusão da votação nas eleições presidenciais de 2024 no estado. A medida é criticada porque pode atrasar a divulgação dos resultados da eleição no estado.
A Geórgia é considerada um estado-chave nas eleições dos EUA, por ter um histórico de ter votações apertadas --o candidato que tiver o maior número de votos leva todos os delegados. Em 2020, o estado estava no centro de uma das tentativas do ex-presidente e candidato republicano Donald Trump de reverter sua derrota para Biden: após perder por pequena margem, Trump ligou para o secretário do estado pedindo para ele "encontrar" 11.780 votos.
A nova regra exige que o número de cédulas de papel — e não o número de votos — seja contado em cada local de votação por três grupos de fiscais eleitorais separados até que as três contagens sejam iguais. Se um scanner tiver mais de 750 cédulas dentro no final da votação, o gerente eleitoral pode decidir começar a contagem no dia seguinte.
Democratas, especialistas jurídicos e defensores da democracia expressaram preocupações de que essas novas regras possam ser usadas pelo ex-presidente e seus apoiadores para causar caos neste estado crucial e minar a confiança pública nos resultados caso ele perca para a vice-presidente democrata Kamala Harris em novembro.
Muitos democratas do estado acreditam que republicanos alinhados com Trump estariam preparando o terreno para outra tentativa de minar o resultado da votação caso o republicano perca novamente por uma pequena margem em novembro --mas desta vez manipulando as regras eleitorais.
A turbulência decorre da tomada do Conselho Eleitoral do Estado da Geórgia no início deste ano por aliados de Trump, depois que legisladores republicanos removeram o secretário estadual, que resistiu aos esforços de Trump para subverter a eleição em 2020. A nova maioria do Conselho Eleitoral começou a fazer mudanças nas regras eleitorais, muitas delas propostas por aliados de Trump, nos últimos meses.
Na Geórgia, os eleitores fazem suas seleções em uma máquina de votação com tela sensível ao toque que, em seguida, imprime uma cédula de papel com uma lista legível das escolhas do eleitor, bem como um código QR que é lido por um scanner para contar os votos.
A decisão do Conselho Eleitoral estadual foi contrária à orientação dos escritórios do procurador-geral do estado, do secretário de Estado e de uma associação de funcionários eleitorais do condado. Três membros republicanos do Conselho Eleitoral --elogiados pelo ex-presidente Donald Trump durante um comício no mês passado em Atlanta-- votaram a favor da medida, enquanto o único democrata no conselho e o presidente, apartidário, votaram contra.
Trump insinuou, sem qualquer evidência, que imigrantes ilegais estariam chegando em massa no país para votar — Foto: Reuters
Em um memorando enviado aos membros do Conselho Eleitoral na quinta-feira (19), o escritório do procurador-geral estadual, Chris Carr, afirmou que nenhuma disposição da lei estadual permite a contagem manual de cédulas no nível dos distritos eleitorais antes que elas sejam levadas ao superintendente eleitoral do condado para a contagem dos votos. Ou seja, a regra “não está vinculada a nenhum estatuto” e é “provavelmente o tipo exato de legislação impermissível que as agências não podem fazer”, segundo o memorando. O documento adverte que qualquer regra que exceda a autoridade do conselho provavelmente não sobreviveria a um desafio legal.
Contestação democrata
Duas regras aprovadas pelo Conselho Eleitoral no mês passado, relacionadas ao processo de certificação da contagem de votos, foram contestadas na Justiça, em dois processos separados --um movido por democratas e outro por um grupo conservador. Um juiz marcou o julgamento da ação dos democratas para 1º de outubro.
Em agosto, o secretário de Estado Brad Raffensperger chamou a regra de contagem manual de “equivocada”, dizendo que ela atrasaria a divulgação dos resultados eleitorais e introduziria riscos aos procedimentos de cadeia de custódia.
Os defensores da contagem manual dizem que a regra é necessária para garantir que o número de cédulas corresponda às contagens eletrônicas nos scanners, nos computadores de registro e nas máquinas de votação. Os três grupos trabalhadores terão que contar as cédulas em pilhas de 50, e o gerente eleitoral precisará explicar e corrigir, se possível, quaisquer discrepâncias, além de documentá-las.
Com isso, os resultados podem ser atrasados se os locais de votação decidirem esperar até que a contagem manual seja concluída antes de enviar os cartões de memória que registram os votos nas máquinas para o local central de tabulação.
Vários funcionários eleitorais dos condados, que se manifestaram contra a regra durante um período de comentários públicos que precedeu a votação, alertaram que a contagem manual das cédulas nos locais de votação poderia atrasar a divulgação dos resultados da noite eleitoral. Eles também expressaram preocupação com a sobrecarga adicional imposta aos trabalhadores eleitorais, que já trabalharam um longo dia.
Líderes da Associação de Registro de Eleitores e Funcionários Eleitorais da Geórgia expressaram preocupações semelhantes às de Raffensperger em uma carta ao Conselho Eleitoral do Estado no mês passado, alertando que a regra acabaria por minar a confiança no processo. Os membros da associação sem fins lucrativos incluem mais de 500 funcionários e trabalhadores eleitorais em todo o estado, de acordo com a organização.
Janelle King, uma membro do conselho que trabalhou com o autor da regra na redação do texto, disse que não estava preocupada se a divulgação dos resultados da noite eleitoral fosse um pouco mais lenta, em favor de garantir que o número de cédulas estivesse correto.
“O que eu não quero é estabelecer um precedente de que priorizamos velocidade em vez de precisão”, disse ela enquanto o conselho discutia a proposta da regra. “Posso garantir, como eleitora, que preferiria esperar mais uma hora para garantir que a contagem esteja correta, do que receber uma contagem dentro daquela hora e descobrir, no encerramento de uma eleição após a certificação, que temos pessoas processando porque a contagem não está correta”, afirmou King.
Diretrizes da Comissão de Assistência Eleitoral dos EUA dizem que “o número total de cédulas emitidas deve estar de acordo com o número total de eleitores processados em cada local de votação”, mas não exigem uma contagem manual das cédulas de um tabulador.
A nova regra agora será arquivada junto ao secretário de Estado e entrará em vigor em 20 dias.
O conselho também adiou até 2025 uma proposta para uma contagem semelhante em locais de votação antecipada presencial.
A associação de funcionários eleitorais pediu ao Conselho Eleitoral estadual, em uma carta na terça-feira, que não considerasse novas regras por conta da proximidade do dia da votação, em 5 de novembro, a menos de 50 dias. A entidade explica que as cédulas já estão sendo enviadas e o treinamento dos trabalhadores eleitorais está bem avançado.
“Não nos opomos às regras porque somos preguiçosos ou porque um operador ou organização política quer que o façamos”, diz a carta. “Nós nos opomos às regras porque são mal escritas, ineficientes, não cumpririam seus objetivos declarados ou iriam diretamente contra a lei estadual.”
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