Confúcio Moura abriu mão de privilégios?

Confúcio Moura abriu mão de privilégios?

A coluna ‘Visão Periférica’ responde ao questionamento e explica o que isso representa para o Estado de Rondônia

Porto Velho, RO – Durante esta semana, a figura do ex-governador Confúcio Moura, do MDB, ganhou notoriedade ao surgir em diversas manchetes regionais como pioneiríssimo da nova safra de senadores da República ao abrir mão dos penduricalhos financeiros envoltos ao mandato.

O emedebista protocolou na Diretoria-Geral do Senado Federal renúncia formal, e em caráter irrevogável, à ajuda de custo; imóvel funcional; auxílio-moradia; veículo oficial; cota de combustível e lavagens automotivas; auxílio-alimentação, cota e reembolso de telefonia residencial, além de abdicar da possibilidade de solicitar auxílio-transporte de qualquer espécie.

Ainda de acordo com as informações assinadas pela assessoria e reproduzidas em pelo menos três sites daqui, a desoneração renderia a economia de algo em torno dos R$ 2 milhões ao final dos oito anos que o congressista tem pela frente.

Ao fazê-lo formalmente, Confúcio, calejado e experiente, adapta-se às deliberações do novo, enquadra-se às exigências mais comezinhas do povo, descendo ao playground para brincar com os prosélitos do liberalismo econômico.

Lamento decepcionar, portanto, leitores (as) que correram até aqui para se deparar com resposta diferente.

Confúcio Moura abriu mão de privilégios?

Sim, abriu!

Mmmmmmmaaaaaaaaasssss...

Do final de 2017 à renúncia do mandato de governador no começo de abril do ano seguinte, e, a partir disso, na condição de civil e candidato ao Senado, Confúcio abriu mão de um privilégio muito mais importante que aqueles apensados extraordinariamente às rendas de senadores e deputados quando deixou de corresponder à altura aos anseios da população rondoniense.

Explico!

O ex-chefe do Executivo aceitou, tacitamente, os desdobramentos do famigerado Escândalo da Ponte de Ji-Paraná, onde, relembremos, o Departamento de Estradas de Rodagem (DER/RO), na figura do ex-diretor-geral, que hoje é deputado, inclusive, autorizou o pagamento de R$ 30 milhões dos cofres estaduais à empresa privada.

Essa dinheirama aí foi bancada com o nosso bolso, cifra oriunda de impostos, para atender às reiteradas solicitações absurdas de realinhamento à obra entregue e cem por cento quitada lá pelos idos de 2010. Contrariando vários pareceres técnicos, o ex-diretor do DER/RO, longe dos olhos dos órgãos de fiscalização, fez um acordo com a construtora em questão via Justiça Arbitral de Ji-Paraná.

O enredo foi denominado pelo promotor de Justiça Geraldo Henrique Ramos como “trama ardilosa para roubar dinheiro público”.

Descoberto pelo ex-deputado Hermínio Coelho, o esquema foi denunciado ao Ministério Público (MP/RO) que, em caráter de urgência, solicitou à Justiça o bloqueio dos pagamentos remanescentes. O Judiciário salvou pelo menos R$ 11,5 milhões do erário; o resto, infelizmente, já havia sido transferido pelo DER/RO à conta do empreendimento.

Logo, R$ 18,5 milhões escorreram pelo ralo até a intervenção judicial, o mesmo valor atualmente bloqueado nas contas de todos os réus que respondem por improbidade administrativa na 1ª Vara da Fazenda Pública da Capital.

Mesmo após eclodir na imprensa e percorrer as hostes do Judiciário, o Escândalo da Ponte não afetou a relação do então governador Confúcio com seu antigo comandado. Prova disso é que ambos inauguraram juntos a nova passarela do Espaço Alternativo, no dia 4 de abril do ano passado, onde o ex-diretor do DER/RO foi homenageado com seu nome registrado na placa de inauguração.

Além disso, já durante as eleições, Confúcio chegou a aparecer em vídeos de campanha do homem que deu causa ao rombo de R$ 18,5 milhões nos cofres de Rondônia, prestando depoimentos favoráveis à candidatura.

Resumindo, o senador não responde diretamente à fenda descomunal do erário, e isso implica dizer, deixando claro, que não figura como réu em qualquer ação relacionada ao caso.

Agora, o seu silêncio complacente a respeito da situação à ocasião denota, repito, que o congressista abriu mão do privilégio de governar, porque, ao omitir-se, aderiu ao fisiologismo, prática mais antiquada e imoral ainda vista em todos os recôncavos do Brasil.

Poderia ter evitado? Talvez sim, talvez não. Mas ao fazer cafuné e dar tapinha nas costas do perpetrador do problema após conhecer os fatos, é inegável, condescendeu calado, na miúda, consequentemente carregando responsabilidade moral solidária.

Sendo assim, os R$ 2 milhões economizados por Confúcio Moura durante os oito anos de mandato como senador precisam ser analisados de outra maneira.

Num cálculo bem raso e reducionista, esse montante teria de ser dividido entre os 26 Estados mais o Distrito Federal para representar de maneira justa e proporcional a tal economia e seus reflexos para Rondônia.

O resultado da divisão, em oito anos, configura a “devolução” [entre aspas, porque o dinheiro não volta] de pouco mais de R$ 74 mil pra cada Estado, digamos assim, já que o Orçamento da União, que custeia o funcionamento do Congresso, é formado, além de outras fontes,  por receitas federais recolhidas em todo o território nacional.

Arredondemos, pois, para R$ 75 mil.

Por outro lado, o Escândalo da Ponte de Ji-Paraná causou prejuízo de R$ 18 milhões aos cofres públicos de Rondônia – sim, só de Rondônia. Seriam R$ 30 milhões, conforme pontuei acima, se a Justiça não interviesse pontualmente.

Ao abrir mão do privilégio de ser governador, Confúcio, mesmo não sendo responsável direto pelos danos ao erário, anuiu à conduta espúria do ex-diretor do DER/RO tanto por não falar nada a respeito quanto ao deixar de afastá-lo. Isso sem contar a campanha eleitoral de mimos mútuos.

Com isso, levando em conta os R$ 18 milhões, Confúcio precisaria de 9 mandatos de senador (72 anos) para "devolver" [lembre-se do porquê das aspas] esse dinheiro. Mas como a economia é proporcionada aos recursos da União, a fatia de Rondônia seria, como disse, pouco mais de R$ 74 mil em oito anos, já arredondados para R$ 75 mil.

Ele teria de assumir 240 mandatos para repor essa grana aos cofres rondonienses, o que levaria 1.920 anos, quase dois milênios. Aos 70, Confúcio, em outro panorama, seria obrigado a ressuscitar quase 28 vezes – usando sua idade atual como teto – para nos reembolsar pelo prejuízo causado através do ato de abrir mão do privilégio de ser governador, aceitando, queira ou não, que o acaudilhado levasse o caixa rondoniense à bancarrota sem consequências administrativas.

Pergunto de novo:

Confúcio Moura abriu mão de privilégios?

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Autor / Fonte: Vinicius Canova

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