O desumano profissional que praticava jornalismo

O desumano profissional que praticava jornalismo

O caso Nilton Capixaba reverberou socialmente, e, após a conclusão das investigações, o epílogo voltou-se contra mim

Porto Velho, RO – Rondônia não é uma região propícia para o exercício pleno do jornalismo independente; na realidade, se você está na área e já conhece bem o cotidiano do campo profissional, entenderá, mais cedo ou mais tarde, que qualquer passo além do convencional, ou seja, das relações públicas à assessoria de imprensa, estará sujeito à execração. Normal, ossos do ofício. 

Se há interesse direto ou indireto na pauta abordada, o repórter não está salvo nem mesmo das investidas mais vis patrocinadas por “colegas” (muy amigos!) de profissão.

Aliás, quem pratica o jornalismo em sua essência precisa entender de antemão, o mais rápido possível, que se trata de uma profissão solitária, ingrata e pouco rentável para quem não se mistura com merchandising.

Tanto quanto causídicos que gostam de usar como marketing a célebre frase de um dos maiores juristas brasileiros do século passado, o mineiro Heráclito Fontoura Sobral Pinto, nós, da comunicação, também fingimos compreender as palavras erroneamente atribuídas a George Orwell.

Para Sobral Pinto, a advocacia não é profissão para covardes; Orwell, por outro lado, se apropriou – sem querer – da autoria da sentença: “Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade”.

A expressão, na realidade, foi parafraseada pelo político britânico Peter Archer quando, em 1988, ao entoá-la durante discurso no Parlamento Inglês, fez questão de creditá-la a William Randolph Hearst, uma espécie de Assis Chateaubriand estadunidense, magnata que inspirou o protagonista de Cidadão Kane (1941), dirigido, escrito, produzido e estrelado pelo antológico cineasta Orson Welles. “Notícia é o que alguém, em algum lugar, não quer publicada: todo o resto é propaganda”, disse.

Três décadas e meia antes, Brian R. Roberts, que foi editor do jornal Daily Telegraph, escreveu uma carta ao periódico The Journal atribuindo a Hearst parte da expressão: “Notícia é algo que alguém quer suprimido”.

O impressionante trabalho de garimpagem realizado pelo site Quote Investigator (Investigador de Frases), verificado por este colunista, como de costume, demonstra, paralelamente, quão importante a apuração sistemática das fontes antes de se publicar matéria ou mesmo um simples artigo de opinião.

Quando abordei suposta ilegalidade na Carta de Emprego apresentada por Nilton Balbino, o Capixaba, do PTB, condenado a quase sete anos de cadeia pelo crime de corrupção passiva por envolvimento com a Máfia dos Sanguessugas, consultei fontes ligadas à magistratura, à Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Rondônia (OAB/RO) e outros atores com conhecimento técnico acerca da execução penal.

Não titubeei.

Veiculei artigo aventando a questão e, logo mais, a Secretaria de Estado de Justiça (Sejus/RO) através da coordenadoria-geral do Sistema Penitenciário mandou tirar o monitoramento e recolher Capixaba às dependências da Penitenciária Estadual de Aruana (PEA) a fim de que fosse instaurado um Processo Administrativo Disciplinar de Interno (PADI).

O procedimento durou 15 dias. Enquanto isso, mesmo com a manutenção do regime semiaberto, o petebista ficou preso – sem direito a saídas. Após o período, o PADI concluiu pela absolvição do apenado, portanto, logo em seguida, o ex-deputado recuperou o direito ao trabalho externo desde que utilizando, de novo, a tornozeleira.

Quando a decisão saiu, veio o “fogo amigo”. Não irei falar sobre o dono do site usado para me dar bordoadas gratuitas, até porque já trabalhei lá. Por questão ética e respeito ao passado, vou ignorá-lo.

Mas há outra figura que merece apontamentos.

Se Sobral Pinto e Randolph Hearst definem advogados e jornalistas verdadeiros em poucas palavras, posso dizer, sem sombra de dúvidas, que fui ofendido por um ser humano flutuando no limbo das profissões: não é uma coisa nem outra.

Explico.

Não pode ser advogado porque é covarde, ataca pelas costas, terceiriza textos e rasteja como um rato pelos esgotos timoratos excursionando seu medo atrás das sombras de seus patrocinadores. Em suma, é um tipo que se alimenta de queijo mofado e rançoso recheado pelas entranhas da própria moral putrefata.

Logo, se não pode ser advogado, tampouco deve ser chamado de jornalista porque, mentindo ao me chamar de mentiroso, bajulando corrupto e distorcendo os fatos tenta, sem sucesso, é óbvio, impedir que “aquilo que alguém não quer que seja publicado”, enfim, seja publicado.

Aqui não!

No futuro, terei a oportunidade de demonstrar passo a passo o roteiro das informações recebidas que culminaram com o aprisionamento de Capixaba.

Por ora, a título de curiosidade, inclusive, vou deixar aqui – mais uma vez – o resultado do Processo Administrativo que o absolveu.

Peço atenção específica ao penúltimo “CONSIDERANDO”, onde Célio Luiz de Lima, coordenador-geral do Sistema Penitenciário, diz, expressamente, que tanto a Comissão Processante quanto a Unidade de Monitoramento apontaram: “[...] que eventual transgressão, em tese, ocorreu por conta do sócio administrador da empresa Leme e não pelo reeducando”.

Sendo assim, subsistem questionamentos que precisam ser respondidos. E serão.

Nilton Capixaba ficou 15 dias sem ver sua família, pouco mais de duas semanas – 360 horas. É provável que a situação tenha afetado pessoas próximas, não duvido. O apelo emotivo deveria, então, demover-me. E eu me senti compelido a parar de fazer perguntas.

Daí lembrei que Balbino foi condenado por embolsar dinheiro (10%) de emendas parlamentares destinadas à compra de ambulâncias, grana que deveria ser aplicada na área da saúde.

Consequentemente, é inevitável, acabei pensando em pais, mães e filhos que provavelmente morreram jogados às traças em hospitais públicos por causa de dinheiro que faltou ali e acolá em decorrência da ganância de Capixaba. Morreram, foram enterrados e nunca mais haverá contato com familiares porque, mesmo que defuntos pudessem falar, os caixões vedariam o som da lamúria. Ao contrário destes mortos, defuntos políticos ainda podem se comunicar – eis aí um privilégio.

Não tem jeito. Sou obrigado a absolver, por consciência tranquila, o desumano profissional que teve a audácia de praticar jornalismo em terras publicitárias.

Indícios de irregularidade precisam ser apurados pelos órgãos competentes e, na grande maioria das vezes, a imprensa auxilia no processo para que o pontapé inicial seja dado. Esse é o nosso papel. Um papel que vocês não irão rasgar.

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Autor / Fonte: Vinicius Canova

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