Por Rondoniadinamica
Publicada em 10/06/2019 às 14h57
Porto Velho, RO – Em 2018, o jovem Vinícius Miguel, à época disputando as eleições pela Rede Sustentabilidade, consagrou-se como verdadeiro campeão de votos em Porto Velho após o encerramento do primeiro turno da disputa pelo Governo de Rondônia.
Dos surpreendentes 110.585 votos que obteve, praticamente 70 mil foram registrados por moradores da Capital, quase 23 mil a mais que o atual governador Coronel Marcos Rocha, do PSL, durante a fase inicial do pleito no ano passado.
Em nova entrevista concedida ao Rondônia Dinâmica, o advogado e professor universitário fala sobre a mudança para o Cidadania, antigo PPS; responde, finalmente, sobre a vontade de ser ou não prefeito de Porto Velho; e conta por que quis se tornar cacique eleitoral.
Além disso, o ambientalista Vinícius Miguel falou sobre como se vê em um partido que, outrora, abrigou ruralistas proeminentes como o ex-governador João Cahúlla e o falecido deputado federal Moreira Mendes; indica também se há possibilidade ou não de brigar por uma cadeira na Câmara Municipal; e revela ao público a sua opinião sobre os candidatos eleitos em 2018. Por fim, apresenta sua primeiras críticas ao atual mandatário do Palácio Rio Madeira.
CONFIRA:
Rondônia Dinâmica – Como foi a transição da Rede, como filiado comum, ao Cidadania, agora na condição de dirigente?
Vinícius Miguel – Eu deixei a Rede Sustentabilidade com profundo pesar, uma grande dor no coração, um coração verdadeiramente partido. Deixei amigos e aliados tão queridos naquele outro partido. O convite ao Cidadania se deu por meio do Jaime Kalb, que concorreu como candidato a vice na minha chapa no ano passado.
RD – Isso logo depois da campanha?
VM – Sim, logo depois. O Cidadania na época passava por um momento de refundação e precisava de lideranças locais. Num certo “vácuo” do partido, ele fez o convite até de modo insistente. Eu recusei, a princípio. E depois houve algumas considerações, como a própria dificuldade de votação da Rede, em âmbito nacional, que não atingiu a cláusula de barreira, não conseguiu eleger cinco deputados federais, enfim, situações estas que dificultam e muito a continuação da legenda. Por conta disso, achei interessante migrar, dentro das condições apresentadas.
RD – Quais foram essas condições?
VM – Me deram garantias de máxima transparência, de máxima possibilidade de diálogo, e de construção do partido no estado inteiro, em todos os municípios, independentemente da proposta de eu ser ou não candidato. Isso acabou se tornando a possibilidade de construir, dentro de uma militância partidária, relações com outras possíveis lideranças e demais candidatos.
RD – Sobre termos de DNA político, Vinícius, você sai de uma legenda, a REDE, que empunha a bandeira do meio ambiente, e ingressa no antigo PPS, que regionalmente abraçou ruralistas proeminentes como o ex-governador João Cahúlla e também o falecido deputado federal Moreira Mendes. A mudança de nome para Cidadania seria apenas uma fachada ou traz consigo alterações de pensamento e estatuto?
VM – O Vinícius Miguel sempre teve a postura de uma defesa intransigente da mediação, do diálogo e da possibilidade de costuras para muito além de simplificações. Eu sempre disse isso. E essa postura sempre me colocou numa posição muito mais difícil do que simplesmente me colocar contra ou a favor de determinada pauta.
RD – Por exemplo?
VM – Você falar, dentro dessa temática de meio ambiente, por exemplo, que não é a favor de um desmatamento desmedido ao mesmo tempo em que não é a favor da depredação e da devastação ambiental, é uma posição incômoda que desagrada aos dois lados. E, no entanto, me parece ser uma posição de mediação, de diálogo e de equilíbrio que é cada vez mais necessária.
RD – E como essa visão se relaciona à transmutação do PPS ao Cidadania?
VM – Eu fico muito à vontade de dizer que, inclusive, esse novo batismo e essa refundação com definição de estatuto, de slogan, de logo, do PPS para o movimento de cidadania, traduz esse novo pensamento conciliatório e democrático.
RD – Você escolheu ser “cacique”? Decidiu, por si só, dar as cartas do jogo?
VM – Acredito que de algum modo passei por um processo de autoidentificação, de autorreconhecimento, me enxergando, a partir das conclusões, como um protagonista do cenário político. Querendo ou não, aceitando ou não. Por isso eu digo que é um processo de autoconhecimento.
RD – A partir de que momento você passou a se enxergar assim?
VM – Bom, é inegável a proeminência que adquiri após a última eleição. Mas é preciso fazer uma ressalva, como já pontuei em outras entrevistas com o próprio Rondônia Dinâmica. Antes desse contexto eletivo, eu já atuava socialmente: então já era assinalado e reconhecido como uma personalidade, por assim dizer, de notoriedade nos ambientes jurídico-científicos.
RD – E você atuava onde e pelo quê?
VM – Conselhos de Direitos, de uma atuação junto a associações, com entidades de classes, com organizações de direitos, enfim, com os mais variados espaços e articulações. Inclusive com a pauta atualmente tida como intragável, que é a violência, a segurança pública, discussões de direitos humanos fundamentais. E sempre numa posição que não é nada cômoda nem simplória.
RD – Direto ao ponto: o Vinicius Miguel tem pretensões de disputar a Prefeitura de Porto Velho em 2020?
VM – É o que eu quero. Porém, e isso tem de ficar bem claro, a decisão não será minha. Montamos o Cidadania para que, em conjunto, decidamos os rumos da legenda. Se acharmos, num contexto partidário, que eu tenho de concorrer, ótimo; caso contrário, será outra pessoa ou, se não houver postulante entre os filiados, a sigla pode apoiar algum nome de outros partidos. Mas tudo terá o momento apropriado para anunciar.
RD – Mas você não descarta concorrer, é isso?
VM – Não. Como eu disse, é o que eu quero. Mas...
RD – Quase 70 mil votos só em Porto Velho numa eleição ao Governo do Estado não o credenciam a certezas?
VM – Eu tenho condições plenas de elegibilidade, não há nada que me impeça. Mas, a despeito da vontade, anda não vejo com bons olhos o contexto político local. Eu tenho sérias dificuldades em me admitir como possível candidato.
RD – Já saíram várias matérias na imprensa mencionando sua eventual candidatura, inclusive no interior. Como você vê isso?
VM – Então, embora só eu possa falar por mim mesmo, jamais desmentiria as inúmeras fontes jornalísticas. Na minha visão, as liberdades de imprensa e de expressão são sagradas. Há pessoas que podem ter falado em meu nome, claro, mas eu não confirmei nada. Não anunciei qualquer forma de pré-candidatura.
RD – Aliás, é perceptível que você não seguiu pelo caminho óbvio ao fim das eleições, que era, naturalmente, aproveitar o capital político ao máximo...
VM – Exatamente. E digo aqui, em primeira mão, que aconteceu justamente ao contrário: eu me distanciei das redes sociais, me afastei das formas político-partidárias que visam eleições de maneira imediata, aquele modelo pragmático de construção de agenda eleitoral.
RD – E fez o que do fim do primeiro turno para cá?
VM – Retomei a plenitude da minha vida. Estou trabalhando no meu escritório de advocacia, dando aulas na universidade e sigo com as minhas coisas. Hoje, por exemplo, submeti projeto de pesquisa de um aluno sobre violência sexual contra crianças e adolescentes à orientação.
RD – O que significa, na sua visão, ser um dirigente partidário?
VM – Significa que estou preocupado com a temática política, mas não necessariamente vinculado somente à agenda eleitoral. E muito menos com agente eleitoral exclusivamente do Executivo municipal.
RD – Então uma cadeira na Câmara Municipal também estaria entre as suas pretensões?
VM – Por que não? Agora, só complementando a questão anterior, o fato de estar dirigente partidário me abre portas para uma atuação política mais ampliada, inclusive no campo de poder propor ações, medidas, representações e denúncias que, caso as recebesse enquanto cidadão comum, talvez não fosse tão simples levar adiante. Então, é um aparelho da sociedade civil muito mais robustecido, uma das muitas formas de participação, sem negar as outras, e me permite a interlocução com demais lideranças político-partidárias sem necessariamente pensar no calendário eleitoral de maneira obrigatória.
RD – Insisto na questão do Legislativo municipal. Você respondeu “por que não?” abrindo reticências à pergunta. Reforcemos, então, devolvendo: por que não?
VM – Eu sempre vejo os dois lados da moeda. Nos meus exercícios de autorreflexão as perguntas que prevalecem são: “Por que sair candidato a isso? Por que não sair candidato àquilo?”. Entende? É preciso sopesar o histórico e o atual contexto, levando em consideração, como disse antes, a deliberação coletiva. Você falou em capital político, mas o capital político não significa nada sem um grupo forte, unido e regido por diretrizes democráticas. Friso: eu quero ser candidato a prefeito, mas posso sair a vereador. E, em comum acordo, pode acontecer de não haver candidatura minha a qualquer cargo que seja. Por isso não quero tomar – e muito menos anunciar – decisões oficiais de maneira precipitada.
RD – Inegável que, na Capital, você “quebrou” a denominada onda bolsonarista que elegeu o presidente da República, o governador Marcos Rocha, o deputado estadual Eyder Brasil e o parlamentar federal Coronel Chrisóstomo, todos do PSL. O que você diria às pessoas que querem vê-lo, nominalmente, na urna eletrônica em 2020?
VM – Eu diria que nós temos de fugir de personalismos e populismos ao pensarmos que existem Messias e salvadores da Pátria na política. Precisamos voltar a discutir política de um modo muito mais alargado, pensando em mudanças profundas nas instituições – independentemente de pessoas. Fico feliz, lisonjeado e honrado por ter passado, em Rondônia, dos mais de 110 mil votos. Entretanto, as alterações no panorama para Porto Velho passam por questões muito mais profundas do que escolher “Candidato A” ou “Candidato B”.
RD – Nós já entramos no sexto mês de mandato do atual governador. Você que foi adversário dele nas eleições passadas, já teria uma opinião sobre a gestão Marcos Rocha?
VM – A princípio, penso que os cem primeiros dias, ou os seis primeiros meses, são formas precoces de se avaliar. No entanto, para quem quer, é sempre possível elogiar ou criticar, dependendo da posição. Porém, posso avaliá-lo como cidadão pensando em suas promessas de campanha: ou seja, no que foi ou não aplicado agora durante o exercício do mandato.
RD – E o que vem à cabeça?
VM – Sobre a pauta ambiental, por exemplo, ele dizia que iria respeitar o critério técnico e que, caso eleito, nomearia um engenheiro florestal para a Sedam/RO, e isso não ocorreu. E isso não quer dizer que o atual gestor seja ruim. No mesmo campo, o então postulante à ocasião falou em série de medidas que visassem a eficiência administrativa. Hoje, entre a aplicação de uma multa ambiental e a efetiva aplicação do interessado por parte do Estado, passam-se mais de seis meses. É uma demora que precisa ser sanada.
RD – Algo mais?
VM – Sim. Outro campo que os jornais noticiaram recentemente é sobre a demora nas nomeações de representantes tanto do Estado quando da sociedade civil em várias instituições participativas, deixando muito a desejar, por exemplo, na seara do controle social. Aliás, também deixa a desejar em termos de fiscalização das contas públicas e até mesmo, e não vejo por que não falar a respeito, da participação popular. Então cria-se um déficit popular no governo. Podemos destacar esses pontos, mas, reiterando, que é precoce fazer juízo de valor acerca de uma gestão que ainda engatinha. Por ora, diria que o chefe do Executivo precisa entender que tem muito a fazer.
RD – O Executivo, para muita gente, é uma máquina de enxugar gelo: o Poder onde, especialmente em Porto Velho, as figuras da grande maioria dos prefeitos saem de lá muito menores do que entraram: o retrospecto é sintomático. Como você avalia esse ponto de vista que enxerga a Prefeitura da Capital como verdadeiro moedor de reputações?
VM – Eu acho que os Executivos municipais, e é algo que precisamos passar a compreender melhor sob a lógica da participação e da cidadania, passam por muitos problemas. Há uma grande burocracia, um conjunto de demandas corporativas e de toda ordem que, querendo ou não, engessam a máquina pública. Esses problemas criam obstáculos à máxima discricionariedade do gestor público. Eu partilho, sim, um pouco dessa preocupação sobre a crise fiscal que se aproxima, principalmente, dos municípios.
RD – Seria a parte mais fraca da relação federativa?
VM – Com certeza. No caso dos municípios, é sobre quem recai a maior parte das obrigações nos campos de saúde, educação, atendimento à população, enfim. E isso gera uma grande tensão. É possível resolver, mas não há como passar incólume pelas dores de cabeça.
RD – Pra finalizar: você acha que o rondoniense votou bem em 2018?
VM – No conjunto da obra, mirando as alegações iniciais de que se pretendia uma renovação, e que isso implicaria na eleição de pessoas sem vínculo prévio à política, sem experiência partidária, sem uma continuidade de mandato, posso dizer que foi uma premissa falsa. Então, nesse sentido, o rondoniense falou uma coisa e nas urnas fez outra. Falou que queria renovação, mas, na prática, isso não se demonstrou. Não houve uma renovação total. Agora, quem vai dizer se votou bem ou não é o próprio eleitor, e geralmente a demonstração dessa insatisfação aparece na eleição subsequente.