Por Rondoniadinamica
Publicada em 05/12/2019 às 15h45
Porto Velho, RO — A promotora de Justiça Aidee Maria Moser Torquato Luiz moveu ação de danos morais contra os jornalistas Alessandro Lubiana e Fabío Camilo, além de envolver a Rádio Rondônia 93,3 FM na contenda judicial.
Os autos foram analisados inicialmente pela juíza de Direito Duília Sgrott Reis, da 10ª Vara Cível da Capital, porquanto a representante do Ministério Público (MP/RO) apresentou solicitação de tutela de urgência e um pedido para que o processo tramitasse sob segredo de Justiça. No último caso, a pretensão fora rechaçada pela magistrada, que anotou: " A prima facie, não vislumbro razão para decretar o segredo de Justiça dos autos".
Aidee Torquato foi exposta pela dupla por conta de áudios supostamente ligados a autoridades relacionadas à Operação Pau Oco. No mérito, ela pede que os comunicadores e a Rádio Rondônia sejam condenados a indenizá-la em R$ 100 mil por danos morais.
A decisão da juíza foi proferida no dia 25 de novembro, mas publicada dois dias depois no Diário Oficial de Justiça na íntegra. O Rondônia Dinâmica reproduz abaixo os termos e, logo em seguida, a íntegra:
" Ante o exposto, defiro parcialmente a tutela pleiteada para determinar aos requeridos que se abstenham de divulgar áudios referentes a fatos que envolvam a intimidade pessoal da parte autora ou à utilizarem palavras, verbetes ou termos pejorativos, que venham a violar o direito de imagem da mesma, no programa RÁDIO RONDÔNIA FM 93,3 até o trânsito em julgado desta demanda, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais), limitado ao valor de 30.000,00(trinta mil reais)", determinou Duília Sgrott à ocasião.
Caso Intercept
Na decisão, a juíza também faz alusão da situação ocorrida em Rondônia com a Vaza Jato, espisódio em que o site The Intercept Brasil utilizou áudios obtidos de maneira ilegal por terceiros para expor a força-tarefa da Operação Lava-Jato, incluindo até mesmo o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, o ex-juiz Sérgio Moro.
" Inicialmente destaco que a questão posta a apreciação não é nova e tem sido diuturnamente debatida no âmbito da sociedade civil, meios de comunicação, universidades e tribunais, sobretudo após a divulgação de áudios de operadores do direito que atuavam na Operação Lava Jato, conhecido popularmente como CASO INTERCEPT", asseverou.
Em seguida, a magistrada diz que aquele fato, "assim como o narrado nestes autos, referese à colisão entre duas garantias fundamentais previstas na Constituição Federal de 1988, quais sejam: a liberdade de expressão e informação de cunho jornalístico e, de outro, ao direito à integridade moral, expressão da personalidade, encontrandose, ambos, constitucionalmente inseridos no rol dos direitos e das garantias fundamentais, estabelecidas no art. 5º, IV, IX, X e XIV, da Constituição Federal de 1988".
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A ÍNTEGRA DO LAERTE:
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Tribunal de Justiça de Rondônia
Porto Velho - 10ª Vara Cível
Avenida Lauro Sodré, nº 1728, Bairro São João Bosco, CEP 76803-
686, Porto Velho, - de 1728 a 2014 - lado par Processo: 7052861-
85.2019.8.22.0001
Classe: Procedimento Comum Cível
Assunto: Proteção da Intimidade e Sigilo de Dados
AUTOR: A. M. M. T. L.
ADVOGADO DO AUTOR: CLEITON CARLOS DE ABREU
COELHO BARRETO OAB nº RO10160
RÉUS: S. R. D. R. L. -. M., A. L., F. W. D. B. C.
ADVOGADOS DOS RÉUS:
Decisão
AIDEE MARIA MOSER TORQUATO LUIZ ajuíza ação de indenização por danos morais, com pedido de tutela de urgência e segredo de justiça, em face de ALEXANDRO LUBIANA, FÁBIO WILLIANS DE BRITO CAMILO e SISTEMA RONDÔNIA DE RÁDIO LTDA (RÁDIO RONDÔNIA FM 93,3), todos já qualificados.
Alega que em novembro/2019 os primeiros requeridos, apresentadores do programa “A Hora do Povo” veiculado pela terceira requerida, passaram a publicar quase diariamente conteúdos supostamente trocados em aplicativo de mensagens por integrantes de um grupo que atuou nas investigações de uma operação policial conhecida publicamente como Operação “Pau Oco”, a qual a parte autora teria atuado desde o início, à condição de Promotora de Justiça do Ministério Público do Estado de Rondônia.
Aduz que os réus nominam claramente a autora, além de fazer menções ofensivas e jocosas tanto a sua conduta pessoal quanto profissional, a expondo de forma injuriosa, difamatória e até caluniosa.
Exemplificadamente, cita que no programa de 12/11/2019 o réu Fábio, antes de divulgar os áudios atribuídos à requerente, comentou que a mesma “parece uma apresentadora de YouTube” (11min10s) e compara desrespeitosamente seu primeiro nome a uma árvore, referindo-se a autora como “Dra. Ipê” (11min31s), assim como o réu Alessandro disse aos 11min15s que “essa promotora, ela aparece num vídeo, num outro vídeo que nós não divulgamos por que não é assunto jornalístico, dançando altas horas da madrugada com um delegado, acho que é essa né?”.
Ademais, os réus comentaram um vídeo em que a autora supostamente aparecia dançando com um Delegado de Polícia, sugerindo que havia um relacionamento amoroso da seguinte forma:
Fábio: é a mesma que estava dançando?
Alessandro: é a mesma.
Fábio: (...) dançando abraçado, que o delegado fala assim: é hoje! É hoje!
Alessandro: é, é hoje, hoje tem hein!
Fábio: é aquela lá? Ah tá, então vamos lá…
Ainda no programa de 12/11/2019, os requeridos publicaram um suposto áudio da requerente em que esta teria ofendido a Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Em 21/11/2019, após inúmeras ofensas à autora nos programas anteriores, os réus expuseram diálogos de conteúdo pessoal/íntimo atribuídos à autora em que a mesma compartilhava comentários acerca de uma suposta conversa tida entre ela e o Governador do Estado relativas a experiências matrimoniais vivenciadas por ambos.
Desta forma, argumenta que a divulgação dos áudios não cumpre a função do exercício ao direito à informação, cuja finalidade era somente afetar a imagem, intimidade, dignidade e honra da requerente.
Por fim, assevera que no programa de 22/11/2019 os réus ameaçaram realizar novas divulgações de áudios, havendo justo receio da autora de que estes também possam ser atribuídos a sua pessoa, com conteúdo pessoal/íntimo, pois o próximo programa está previsto para ir ao ar em 25/11/2019 a partir do meio-dia.
Requer a concessão de tutela de urgência para determinar aos réus que “se abstenham de divulgar áudios que comprometam a inviolabilidade da intimidade, honra, privacidade e imagem da requerente, tais como opiniões pessoais e íntimas, sob pena de aplicação de multa por matéria divulgada no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) a ser revertida em favor da requerente, requerendo ainda que eventual ordem seja cumprida por Oficial de Justiça, com máxima urgência, objetivando impedir a divulgação de eventuais novos áudios no programa “A Hora do Povo” que será veiculado no dia 25 de novembro de 2019”, assim como que os réus se abstenham de “realizar qualquer comentário público (oral, por termo, por vídeo ou mediante publicações na internet e redes sociais) acerca dos fatos objeto de análise na presente demanda”. No mérito, postula a confirmação da tutela e condenação ao pagamento solidário de R$100.000,00 a título de indenização por danos morais.
É o relatório. Decido.
FUNDAMENTOS DA DECISÃO
Para a concessão da tutela de urgência, é necessário que fique demonstrando a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300, CPC), desde que não haja perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, sendo que os dois requisitos devem ser vislumbrados em conjunto.
Segundo as lições de Humberto Theodoro Júnior (Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, 57. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2016), existem basicamente dois requisitos para alcançar uma providência de urgência de natureza cautelar ou satisfativa. São eles: a) um dano potencial, que se configura no risco do processo não ser útil ao interesse demonstrado pela parte, em razão do periculum in mora, e b) a probabilidade do direito substancial invocado, ou seja, o fumus boni iuris.
Inicialmente destaco que a questão posta a apreciação não é nova e tem sido diuturnamente debatida no âmbito da sociedade civil, meios de comunicação, universidades e tribunais, sobretudo após a divulgação de áudios de operadores do direito que atuavam na Operação Lava Jato, conhecido popularmente como CASO INTERCEPT.
Aquele fato, assim como o narrado nestes autos, referese à colisão entre duas garantias fundamentais previstas na Constituição Federal de 1988, quais sejam: a liberdade de expressão e informação de cunho jornalístico e, de outro, ao direito à integridade moral, expressão da personalidade, encontrandose, ambos, constitucionalmente inseridos no rol dos direitos e das garantias fundamentais, estabelecidas no art. 5º, IV, IX, X e XIV, da Constituição Federal de 1988.
A Carta Magna prevê a livre manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. Todavia esse direito fundamental não é absoluto, podendo sofrer limitações. A respeito dessa limitação, o Min. Celso de Mello, do STF (RMS 23.452/RJ) esclareceu: “os direitos e garantias individuais não têm caráter absoluto. Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas - e considerado o substrato ético que as informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.”
Portanto a colisão dos direitos fundamentais supracitados – liberdade de expressão/direito à informação versus direito à integridade moral, expressão da personalidade, não se resolve mediante o emprego dos critérios tradicionais de solução de conflitos de normas, como o hierárquico, o temporal ou da especialização.
Ao reverso, em tais situações, o intérprete deve utilizar a técnica da ponderação de interesses, por via da qual deverá fazer concessões recíprocas entre as pretensões em disputa, preservando o máximo possível do conteúdo de cada uma, vale dizer, buscando o equilíbrio dessas duas garantias fundamentais, de modo que a liberdade de expressão não ultrapasse à barreira estabelecida da proteção aos direitos da personalidade, em especial o direito à intimidade das pessoas.
Neste sentido o Min. Marco Aurélio Bellize, do Eg. STJ, destacou que :
O Superior Tribunal de Justiça, à procura de solução que melhor se ajusta às reflexões precedentes, estabeleceu, para situações de conflito entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade, entre outros, os seguintes elementos de ponderação:
a) o compromisso ético com a informação verossímil; b) a preservação dos chamados direitos da personalidade, aí incluídos os direitos à honra, à imagem, à privacidade e à intimidade; e c) a vedação de veiculação de crítica jornalística com intuito de difamar, injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi) - (cf. REsp n. 801.109/DF, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/6/2012, DJe 12/3/2013).
No mesmo sentido a posição adotada pelo TJRO, segunda câmara cível, citando como paradigma a apelação 0010004-90.2012.8.22.0001, Rel. Des. Isaías Fonseca Moraes. O Supremo Tribunal Federal, de outro passo, tem considerado também como critério objetivo, a maior ou menor exposição pública da vítima, como relevante para aferição da possível lesão à honra e para limitação ao direito à liberdade de expressão ( cf. HC 78426, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ 07-05-1999 ).
Na hipótese sub judice, pela narrativa da petição inicial e pedidos formulados, objetiva-se determinar que os réus se abstenham de divulgar áudios que comprometam a inviolabilidade da intimidade, honra, privacidade e imagem da requerente, tais como opiniões pessoais e íntimas.
A prima facie, o pedido de tutela de urgência não pode ser deferido integralmente por configurar censura prévia, a qual é repelida frontalmente pelo texto constitucional, em virtude de sua finalidadee antidemocrática ( MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO 26.978 CEARÁ - Rel. Min. Alexandre de Moraes).
Todavia, é possível determinar que os réus se abstenham de utilizar palavras, verbetes ou termos pejorativos, que venham a violar o direito de imagem da parte autora, maculando-lhe a honra subjetiva, como ocorreu no dia 12/11/2019, em que o requerido Fábio, antes de divulgar os áudios atribuídos à requerente, comentou que a mesma “parece uma apresentadora de YouTube” (11min10s) e compara desrespeitosamente seu primeiro nome a uma árvore, referindo-se a autora como “Dra. Ipê” (11min31s) e quando o requerido Alessandro afirmou (11min15s) que “essa promotora, ela aparece num vídeo, num outro vídeo que nós não divulgamos por que não é assunto jornalístico, dançando altas horas da madrugada com um delegado, acho que é essa né?”
É preciso que fique claro que não se obsta o direito a informação quando da ocorrência de ato ilícito, seja cível, criminal ou administrativo, o que se coíbe é a utilização de palavras, verbetes ou termos pejorativos, que venham a violar o direito de imagem da pessoa, maculando-lhe a honra subjetiva. Nesse sentido é a posição do Superior Tribunal de Justiça:
A responsabilidade civil decorrente de abusos perpetrados por meio da imprensa abrange a colisão de dois direitos fundamentais: a liberdade de informação e a tutela dos direitos da personalidade (honra, imagem e vida privada). A atividade jornalística deve ser livre para informar a sociedade acerca de fatos cotidianos de interesse público, em observância ao princípio constitucional do Estado Democrático de Direito; contudo, o direito de informação não é absoluto, vedando-se a divulgação de notícias falaciosas, que exponham indevidamente a intimidade ou acarretem danos à honra e à imagem dos indivíduos, em ofensa ao fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana. (REsp 818.764/ES, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, julgado em 15/02/2007, DJ 12/03/2007, p. 250)
Ante o exposto, defiro parcialmente a tutela pleiteada para determinar aos requeridos que se abstenham de divulgar áudios referentes a fatos que envolvam a intimidade pessoal da parte autora ou à utilizarem palavras, verbetes ou termos pejorativos, que venham a violar o direito de imagem da mesma, no programa RÁDIO RONDÔNIA FM 93,3 até o trânsito em julgado desta demanda, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais), limitado ao valor de 30.000,00(trinta mil reais).
CUMPRA-SE COM URGÊNCIA VIA OFICIAL DE JUSTIÇA PLANTONISTA.
2. A prima facie, não vislumbro razão para decretar o segredo de justiça dos autos.
3. Considerando o advento do Novo Código de Processo Civil e a priorização do sistema pelas formas consensuais de solução dos conflitos, na forma do art. 334 do CPC, deveria ser designada audiência de conciliação para estes autos.
No entanto, em análise das audiências já realizadas pela CEJUSC, foi observado que algumas empresas, como é o caso da parte ré neste processo, não trazem proposta de acordo na totalidade das audiências realizadas. Isso causa um atraso injustificado no processo de quase 03 meses, pois o prazo para defesa pela parte ré só passa a correr após a realização desta audiência.
Em virtude disso, não será designada audiência de conciliação e mediação.
4. O prazo para oferecimento de contestação é de 15 (quinze) dias, a iniciar-se da juntada da citação, conforme descreve o art. 231 do CPC.
5. Findo o prazo para contestação, com sua apresentação, dê-se vista dos autos à parte autora para manifestação em 15 (quinze) dias, nos termos dos arts. 350 e 351, CPC
6. Após, com ou sem impugnação do autor, o que deverá ser certificado, retornem-se os autos conclusos para providências preliminares e/ou saneamento do feito (art. 347, CPC).
7. As partes ficam intimadas via sistema PJe.
SERVE COMO CARTA/OFÍCIO/MANDADO/PRECATÓRIA
RÉUS: S. R. D. R. L. -. M., AV. PINHEIRO MACHADO 1231, SALA A OLARIA - 76900-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, A. L., AV. PINHEIRO MACHADO 1231, SALA A OLARIA - 76900-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, F. W. D. B. C., AV. PINHEIRO MACHADO 1231 OLARIA - 76900-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA
SERVE COMO CARTA/OFÍCIO/MANDADO/PRECATÓRIA
RÉUS: S. R. D. R. L. -. M., AV. PINHEIRO MACHADO 1231, SALA
A OLARIA - 76900-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, A. L., AV.
PINHEIRO MACHADO 1231, SALA A OLARIA - 76900-000 - PORTO
VELHO - RONDÔNIA, F. W. D. B. C., AV. PINHEIRO MACHADO
1231 OLARIA - 76900-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA
Porto Velho/RO, 25 de novembro de 2019 .
Duília Sgrott Reis
Juiz (a) de Direito